“Prioridade nas relações EUA-Angola é a economia, não a democracia”, diz analista

Avatar By Redacao Fev 28, 2024
José Gama

Em um questionário ao semanário Novo Jornal, o analista político, José Gama, abordou diversos aspectos relacionados à (re) aproximação dos Estados Unidos com Angola e suas possíveis implicações. Confira os principais pontos destacados por Gama conduzida pelo jornalista Ilidio Manuel.

1- Do seu ponto de vista, a que se deve a (re) aproximação dos EUA a Angola? Houve alguma influência da guerra entre e Rússia contra a Ucrânia ou a inflexão da RSA?

Os EUA tem uma agenda para a construção de corredores econômicos em África, e um deles é o corredor do Lobito que servirá para escoar o cobalto que as suas companhias exploram na Republica Democrática do Congo. O cobalto é usado para fabricação os smartphone e para as baterias. Porem, os EUA precisam de Angola por causa do Porto do Lobito e para ajudar na estabilização da RDC. Se a RDC estabilizar, os EUA tem as suas empresas a funcionar nesta região numa atmosfera de tranquilidade. Uma segunda razão desta aproximação, é a estratégia de diluir a influencia chinesa em África, e Angola é o maior devedor deste gigante asiático, logo a estratégia de vencer a china no nosso continente deve passar por Angola.

2- Há uma enorme expectativa do lado angolano, pelo que se crê em alguns sectores que o «affair» entre os dois países irá tirar o nosso país do marasmo económico e social em que se encontra. Subscreve?

Depois da África do Sul, Angola é o pais da região austral da SADC, com quem os EUA partilham o maior volume de negócios, em termos de trocas comerciais na ordem dos USD 3,2 bilhões por ano. Com a África do Sul as trocas comerciais são de USD 10,4 bilhões. O menor será com Madagascar com 0,4 bilhões. O Presidente dos EUA tem a parceria para Infraestruturas Globais e Investimento (PGI), na qual está inserido o corredor do Lobito. A parceria não é uma garantia de que Angola irá sair do marasmo económico e social em que se encontra, mas poderá ajudar a melhorar o clima de negócios, o que pode tornar o país mais atractivo para os investidores estrangeiros.

3- Em que aspectos a cooperação de Angola com os EUA será diferente da que existia entre o nosso país e a China, ou mesmo a Rússia? Ou será o mais do mesmo?

A cooperação de Angola com a China e Rússia, foram marcadas com menos exigências em termos de reformas económicas e políticas. Com Menor ênfase na questão dos direitos humanos. Com os EUA haverá maior pressão por parte da sociedade civil e da própria administração americana para maior transparência e responsabilidade. A cooperação com a China e Rússia mesmo na área da defesa, era mais virada na formação e despesas militares, já com os EUA a cooperação estende-se a discussões em áreas como segurança regional
e combate ao terrorismo.

4- Acha que os EUA serão capazes de pressionar o Executivo para que proceda às reformas para a democratização do nosso país, sobretudo a realização das autarquias?

Os EUA e Angola desenvolveram neste momento uma relação de interdependência. Os EUA precisam do corredor do Lobito para transportações dos seus mineiros, e para mediar na estabilidade do Congo, e Angola precisa dos EUA para lhe emprestar prestigio, e para se legitimar visto que realizou eleições gerais sem ter sido perturbada. Angola realizou eleições gerais em que não se conseguiu provar se os resultados divulgados pela CNE tivessem correspondência aos das actas sentisses, e os EUA fecharam os olhos. É dos poucos países que realizou eleições e não teve parte envolvida da realização do pelito a ser sancionada por subversão eleitoral. A administração Biden revela-se muito delicada a questão de abuso as liberdades cívicas. O Presidente João Lourenço tem problemas em questões dos direitos humanos e mesmo assim foi recebido na Casa Branca, o que é anormal. A conclusão que se chega é que os EUA decidiram redefinir a sua aproximação com Angola, decidindo não incomodar o governo quanto a implementação de um estado de direito e democrático. A prioridade nas relações será apenas de ordem econômica e negócios. Portanto, vão recuar quanto a questão de forçaram com que Angola proceda a reformas econômicas.

5- Com a presença dos EUA em Angola, a sociedade civil, sobretudo as suas organizações, assim como a mídia privada terão mais espaço?

A sociedade civil no geral perdeu esperança sobre o papel que os EUA poderiam desempenhar para forçar o governo angolano a respeitar mais as liberdades e avançar para o pluralismo. O novo embaixador que poderia desempenhar este papel, é abertamente apaixonado pelo MPLA. Ele não esconde esta devoção que passou a desenvolver. Na véspera das eleições de 2022, ele foi aproximado por alguns partidos da oposição, e o pensamento identificado nele era de que a prioridade seriam os interesses econômicos. A prioridade era ter um governo que garantisse a continuidade dos interesses americanos em Angola, e em véspera de campanha eleitoral, o embaixador americano em Luanda foi claro em dizer que só não vê os avanços quem não quer. O embaixador foi parcial ao fazer este discurso de campanha em beneficio do MPLA.

6- Acredita que o Governo será novamente tentado a «controlar» para posterior banir as ONG´s que não comungam com os seus ideais?

Há um projecto de sufoco as ONG, do Presidente João Lourenço, que chegou a ser duramente criticado pela ordem dos advogados dos EUA, depois de um parecer solicitado. O executivo tem agora uma lei sobre o sistema de segurança nacional que procura incutir uma cultura secutaria no país, a semelhança do que acontece em regimes totalitários como o da Coreia do Norte. São os regimes totalitários que procuram incutir obrigatoriamente a sua ideologia na sociedade. Já são duas leis de sufoco ao Estado de direito e democrático que o Presidente tem em carteira. Esta nova lei sobre o sistema de segurança prevê ações sancionarias contra quem se recusar a colaborar com a segurança de estado. As pessoas que por razões religiosas não querem meter-se em politica, vão ter problemas com esta nova lei. Ela vai ferir os princípios de um estado laico. É uma lei anti constitucional.

José Gama, analista politico e especialista em relações internacionais e diplomacia pela University of South Africa.