O silêncio de João Lourenço diante da intolerância política – Lucas Pedro

Avatar By Redacao Abr 28, 2024
O silêncio de João Lourenço diante da intolerância política - Lucas Pedro

Nos últimos anos, temos testemunhado um aumento preocupante da intolerância política em Angola, com militantes do MPLA, partido no poder, muitas vezes sendo os protagonistas desses actos condenáveis. No entanto, o que é ainda mais alarmante é a aparente passividade do Presidente da República, João Lourenço, diante dessa preocupante situação, 22 anos depois do fim da guerra civil.

É inegável que João Lourenço assumiu a presidência com promessas de mudança e renovação. Sua ascensão ao poder, em 2017, despertou esperanças – confesso-vos que acreditei piamente nesse lenga-lenga – de que a democracia em Angola seria fortalecida e que a intolerância política, particularmente, seria combatida e banida de forma decisiva.

No entanto, sua actuação tem sido marcada por uma notável falta de acção diante dos casos de violência e perseguição política cometidos por membros do próprio partido contra cidadãos que não se reveem no seu partido, ou seja, da UNITA.

É bem verdade que a intolerância política mina os pilares da democracia, sufocando o debate saudável e restringindo a liberdade de expressão. Em uma democracia verdadeira, o confronto de ideias deve ser incentivado, e o respeito pelas opiniões divergentes deve ser uma norma fundamental.

Mas, em Angola, temos visto uma atmosfera de medo e intimidação, onde aqueles que se atrevem a criticar o governo ou o partido no poder são silenciados através de ameaças, violência, perseguição ou mesmo cadeia.

Como líder máximo do país, João Lourenço tem a responsabilidade de proteger os direitos e liberdades de todos os cidadãos, independentemente de suas filiações políticas. Sua inação diante da intolerância política envia uma mensagem preocupante de conivência e complacência.

Ao não tomar medidas firmes – como salientou ontem o líder do Grupo Parlamentar da UNITA, Liberty Chiyaka na Assembleia Nacional – para conter esses abusos, ele está permitindo que a democracia em Angola seja erodida lentamente, já que, como disse nos tempos idos o malogrado ex-Presidente José Eduardo dos Santos, [a democracia] nos foi imposta.

É compreensível que, como líder de um partido político, João Lourenço possa enfrentar pressões internas para manter a coesão e o controle dentro do MPLA. No entanto, sua lealdade deve estar primeiramente ao povo angolano e aos princípios democráticos pelos quais tantos lutaram e morreram pela paz hoje alcançada. A falha em proteger esses princípios é uma traição à confiança daqueles que supostamente o elegeram e compromete o futuro democrático do país.

Chegou o momento de João Lourenço agir com coragem e determinação para enfrentar a intolerância política em Angola. Ele deve enviar uma mensagem clara aos militantes do seu partido (MPLA) de que a violência e a perseguição minam o processo da paz e reconciliação nacional que se pretendem acimentar, mesmo que isso signifique confrontar membros poderosos de seu próprio partido. Somente assim Angola poderá avançar verdadeiramente rumo a uma democracia plena e inclusiva, onde todas as vozes são ouvidas e respeitadas.

Pois, a inércia de João Lourenço diante dessa situação [intolerância política] também levanta sérias preocupações sobre o compromisso do governo angolano com os direitos humanos e o Estado de direito.

Em uma democracia saudável, a justiça deve ser lato sensu e acessível a todos os cidadãos, independentemente de sua filiação política. No entanto, a impunidade para os perpetradores de violência política envia uma mensagem perigosa de que o governo está disposto a fechar os olhos para abusos, como no passado, em nome de uma suposta estabilidade política. Sic!

Além disso, a tolerância à intolerância política pode ter consequências devastadoras para a coesão social e a estabilidade do país a longo prazo. O ressentimento e a alienação gerados pela perseguição política podem alimentar divisões profundas na sociedade angolana, minando a confiança nas instituições democráticas e exacerbando tensões étnicas e sociais.

Em suma, a passividade de João Lourenço diante da intolerância política prejudica a imagem internacional de Angola e mina a credibilidade do país no cenário global. O respeito pelos direitos humanos e pelas liberdades fundamentais é um princípio universalmente reconhecido, e os líderes políticos são julgados não apenas por suas acções dentro de suas fronteiras, mas também por seu compromisso com esses valores em nível internacional.

Ao permitir que a intolerância política floresça (como aconteceu recentemente no Cuando Cubango), João Lourenço compromete não apenas a reputação de Angola, mas também sua posição como líder (da paz) comprometido com os princípios democráticos.

Jornalista, jurista e escritor